Proporcionalidade nas investigações conduzidas pelas Is
A importância de garantir direitos fundamentais e evitar abusos em processos investigativos.
Quando discutimos a perda de liberdade, é crucial entendermos a profundidade desse tema. A liberdade é nosso bem maior, nosso patrimônio mais valioso, e sem ela, não somos nada. Portanto, ao abordar a questão da liberdade, especialmente sua perda, devemos agir com extrema cautela. O direito de ir e vir é um dos direitos mais consagrados que um ser humano pode ter. É a essência da liberdade. Assim, em qualquer discussão sobre a perda de liberdade, devemos ser prudentes.
Recentemente, li uma reportagem que afirmava que duas pessoas influentes, investigadas por uma Comissão Parlamentar de Inquérito, poderiam perder seus aportes caso não comparecessem para prestar depoimento. Isso chamou minha atenção, pois, segundo consta da notícia, o Supremo Tribunal Federal concedeu um habeas corpus permitindo que essas pessoas decidam se desejam ou não comparecer à I, exercendo assim seu direito constitucional de não se auto-incriminar. Ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo.
Estamos diante de uma decisão do Supremo Tribunal Federal que desobriga essas pessoas de comparecerem à I para prestar depoimentos. No entanto, a Comissão Parlamentar de Inquérito indicou que, caso não compareçam, elas poderiam perder seus aportes e serem incluídas na lista de difusão vermelha da Interpol.
Retornando ao tema central, é importante ressaltar que a liberdade não pode ser removida sem uma decisão judicial fundamentada. Apenas o Poder Judiciário tem a autoridade para restringir a liberdade de alguém. Se retiramos o aporte de uma pessoa, sem fundamentação suficiente, podemos estar agindo de forma desproporcional. No momento em que intimidamos uma pessoa com o objetivo de lhe retirar parte de sua liberdade, visando um fim específico, podemos contaminar a colheita de provas. Embora as Comissões Parlamentares de Inquérito possuam certos poderes investigativos, elas não podem exercer o papel de um juiz. Em circunstâncias extremamente limitadas, uma I pode recomendar uma prisão, mas este não é o caso em questão.
No julgamento do RHC nº 97.876/SP, sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que o acautelamento de aporte é uma medida que limita a liberdade de locomoção, podendo representar um constrangimento ilegal e arbitrário.
Confira trechos da ementa desse caso:
2. Nos termos da jurisprudência do STJ, o acautelamento de aporte é medida que limita a liberdade de locomoção, que pode, no caso concreto, significar constrangimento ilegal e arbitrário, sendo o habeas corpus via processual adequada para essa análise.
5. Assim, no caso concreto, após esgotados todos os meios típicos de satisfação da dívida, para assegurar o cumprimento de ordem judicial, deve o magistrado eleger medida que seja necessária, lógica e proporcional. Não sendo adequada e necessária, ainda que sob o escudo da busca pela efetivação das decisões judiciais, será contrária à ordem jurídica.
6. Nesse sentido, para que o julgador se utilize de meios executivos atípicos, a decisão deve ser fundamentada e sujeita ao contraditório, demonstrando-se a excepcionalidade da medida adotada em razão da ineficácia dos meios executivos típicos, sob pena de configurar-se como sanção processual.
A ameaça de perda dos aportes por não comparecimento à I, mesmo diante de uma decisão do Supremo, parece desproporcional. A liberdade, assegurada por decisão do Supremo, não pode ser ameaçada por critérios de oportunidade ou conveniência investigativa. Investigações criminais sobre crimes cometidos sem violência ou grave ameaça devem ser conduzidas de maneira proporcional, podendo ser anuladas se realizadas de forma arbitrária.
Essa situação apresenta riscos ao Estado Democrático de Direito e ao devido processo legal. Intimidações desproporcionais afrontam os direitos individuais e podem levar à nulidade de provas obtidas por meios questionáveis. Portanto, as investigações devem respeitar o devido processo legal para garantir que, ao chegarem ao Poder Judiciário, as provas sejam consideradas válidas.
Em suma, a intimidação na coleta de provas não é a melhor abordagem, pois compromete a validade da prova e pode resultar na nulidade de todo o processo investigativo, configurando uma violação ao devido processo legal e às decisões do Supremo Tribunal Federal.
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